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sábado, 29 de novembro de 2014

D. BIBAS (Alexandre Herculano)

 “O bobo, que habitava nos paços dos reis e dos barões, desempenhava um terrível ministério. Era ao mesmo tempo juiz e algoz; mas julgando sem processo, no seu foro íntimo, e pregando, não o corpo, mas o espírito do criminoso no potro imaterial do vilipêndio. E ele ria; ria contínuo! Era rir diabólico o do bobo: porque nunca deixava de ir pulsar dolorosamente as fibras de algum coração. Os seus ditos satíricos, ao passo que suscitavam a hilaridade dos cortesãos, faziam sempre uma vítima… E por cima daquele estrépito de palmas, de gritos, de rugidos de indignação, de gargalhadas, que gelavam frequentemente nos lábios dos que as iam soltar, ouvia-se uma voz esganiçada que bradava e ria, um tinir argentino de guizos, um som baço de adufe; viam-se brilhar dois olhos reluzentes e desvairados, num rosto disforme, onde se pintava o escárnio, o desprezo, a cólera, o desfaçamento, confundidos e indistintos… Na torrente dos desvarios, quando mais violento derramava em roda de si a lava ardente dos ditos insultuosos e cruéis, nunca dos lábios lhe saiu palavra que fosse despedaçar a alma de uma dama. D. Bibas debaixo da sua cruz de espada de lenho, sentia bater um coração português, português da boa raça dos godos.”






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